segunda-feira, setembro 11, 2006

Joaquim - Capitulo VI

Mais um capítulo nesta saga que já se tornou uma das melhores histórias escritas na internet, a meias, entre dois tipos que acreditam que a cientologia não devia ser uma religião nem ciência mas sim um clube de sueca. Já vai no sexto capítulo. O que faz pensar que você anda a perder muito na vida, não é?


Catarina coloca o Joaquim no chão, vira-se de costas e ouço a sua voz nu tom bastante irritadiço, como se falasse para dentro:
-Que merda de dia. Eu devia... – barafustava ela enquanto eu tentava vestir as calças à pressa. Tudo porque tentava esconder a enorme protuberância que se tornava cada vez mais evidente e proeminente ao nível da zona do baixo ventre.
-Devias o quê? – interpelava eu para ganhar uns segundos de distração, o suficiente para desviar o assunto e o olhar da Catarina do enorme inchaço que se tornava cada vez mais incómodo. Esta mulher deixava-me sempre louco de desejo, mesmo 4 anos depois sentia uma ligação e uma atracção física incontrolável.
Desesperado, para que as calças entrassem o mais rápido possível, atrapalhei-me e num gesto bizarro pisei uma das baínhas, ficando sem apoio sustentável e fui conhecer pessoalmente o chão de tacos da anfitriã. Bati violentamente com a cabeça no chão. O meu cérebro esquecera-se de passar a informação às mãos e pernas que se degladiavam entre si esquecendo-se de uma função básica na queda, conhecida como "amparar". Nesse instante, Catarina lança-se na minha direcção e num voo diabolicamente olímpico consegue amortecer a minha queda segurando-me um dos braços. Não o devia ter feito. Preferia ter marrado mesmo de frente ao chão do que assistir pessoalmente ao momento incómodo que se seguiu. Explica-se. No preciso momento em que ela segurou-me, senti a sua suave mão em contacto com a minha pele. Todo o meu corpo estremeceu numa questão de milésimos de segundo, lembrando-se do seu último e suave toque feminino quatro anos antes, exactamente pela mesma mão. Num silvo rápido e intenso, descontrolei-me e ejaculei abundantemente à medida que caía. Larguei um enorme grito, não de pânico mas de prazer e acabei estatelado no chão a ganir como um cão. Catarina aproximou-se:
-Meu Deus, estás bem?
Eu gemi mais duas vezes, completamente extasiado. Ela virou-me de costas e eu prontamente assumi uma posição fetal agarrando tudo aquilo que me fazia homem. Foram 4 anos contidos que agora desapareciam em poucos segundos garantindo-me um prazer inimaginável. Catarina, alheia a este facto, olha para a minha zona pélvica e dá um salto para trás, assustada. Leva as mãos à cara e grita desesperada ao ver que estava todo molhado:
-Meu Deus...que horror....esborrachaste os tomates!!!!!
-Mas...não...
-Temos de ir a um hospital...meu Deus.... – abriu a sua mala à procura do telemóvel – vou chamar o 112.
-Não...não... – um misto de prazer com dor provocavam-me um aperto nas cordas vocais impedindo um volume mais alto no tom de voz.
-Bolas, tenho de ir para a varanda que aqui não tenho rede.. – e começa a cheirar----snif...mas que cheiro é este? Parece que cheira a...– Passa por mim e desta vez demora mais tempo a olhar para este triste espectáculo enquanto eu permaneço com um sorriso estúpido na cara:
-Alfredo...tenho a sensação de que rebentaste mesmo os tintins... é que está aqui um cheiro a....
-Sim...eu estou bem...não foi nada. Isto acontece-me sempre que marro de frente com o chão da tua casa.
Catarina ainda fica quieta e em silêncio a tentar processar certas informações. Segundos depois, denoto que já descobriu o que se passa. Desliga a chamada e volta a guardar o telemóvel na mala:
-Bem, se calhar é melhor ires tomar um banho...
-Sim, é melhor – acedi eu enquanto me levantava de novo sem calças. Começo a andar em direcção à casa de banho quando me lembro do Joaquim:
-Onde é que raio está o caralho do gato? – Olhei para a varanda e vejo o meu casaco ganhar vida própria. Mexe-se no chão. Um vulto movimentava-se dentro do bolso do meu casaco. Suspirei de alívio. “Ah, está a tomar conta do material!”. Lembrava-me agora que ainda possuía uma arma e droga que tinha de ser despachada no final desse dia. Droga, uma palavra que me reavivara a história do bófia quando falara de uma suposta apreensão esta manhã. Poderia ser um achado e uma óptima fonte de rendimento se eu o tivesse seguido, quem sabe poderia descobrir o local da apreensão e conseguir sacar a droga primeiro. Ora aí está uma boa perspectiva de negócio. E sabendo que quando há uma apreensão significa de que existe quantidade....mas o que é que estás a pensar Alfredo? O homem já se foi. Esquece. Neste momento só precisas de um bom banho, convencer a Catarina a dar-te um tecto enquanto as coisas se acalmam e tu despachas o material. Tranquilo. Nada mais simples. Depois logo se vê.
Entrei na pequena casa de banho. Foi brindado com uma mistura de cheiros, aromas e sensações. Tudo com delicadeza e pureza femininas. Entra-se numa casa de banho de gajo, ele pode ter lá todos os cremes paneleiros e os perfumes mais caros do planeta, que o cheiro da urina da sanita ganha vida e sobrepõe-se a todos os outros. Tudo isto me fez lembrar a minha mãezinha que, sempre que lavava a casa de banho, vociferava: “merda para o caralho dos homens!”. Não por inveja de o fazermos de pé mas sim porque salpicamos sempre tudo. Aquela casa de banho não tem nada disso. Por existir outra casa de banho mais pequena para as visitas, esta aqui permanecia pura e limpa de homens. Aqui reina o cheiro de cremes, do gel, do shampo, da loção, do perfume, do sabonete, até a humidade do cortinado que cobre a banheira tem outro cheiro. E está tudo tão limpo que se fosse realizado o teste do algodão, concerteza que seria o responsável pela conspurcação do ambiente.
Um canto daquela divisão chamou-me a atenção. Totalmente fora do contexto deste arranjo celestial, de brilho e limpeza, uma pilha enorme de revistas e jornais rasgados ocupa um enorme espaço. Tirei a revista de cima e comecei a folhear. De repente cai uma folha solta, propositadamente arrancada. Tento ver com mais atenção e vejo metade de um anúncio de publicidade. Era de uma urbanização, mostravam-se plantas e imagens de tranquilidade e espaço. Não fazia sentido nenhum ela ter separado esta folha das restantes. Estaria a pensar mudar de casa? Mas para Almeirim, o local indicado naquele reclame? Foi então que decidi virar a página. Do outro lado encontrei uma folha de horóscopos. Voltei a colocar a folha dentro da revista e decidi tirar outra da pilha. Aconteceu exactamente o mesmo. Desprendeu-se uma folha, de um lado metade de uma reportagem sobre barcos, do outro uma folha de horoscopos.
-Bolas...claro, como é que não pensei nisto antes? – Falei em voz alta. Tal como já avisara, é sempre bom acordar a voz silenciosa que ouvimos por dentro. Catarina era fascinada por tudo o que evocava misticismo, astrologia e essas coisas do além para as quais eu fico aquém.
Senti um aperto nos intestinos e sentei-me na sanita. Puxei de uma revista e comecei a ler os horoscopos. Em comum, havia marcas e círculos à volta de “Aquário”. Não é preciso ser muito inteligente para deduzir que tinha encontrado o signo de Catarina. Decidi procurar o mais recente. Diz o dela:

“AQUÁRIO
Esta semana tudo tende a correr bem dada a sua inspiração para enfrentar os problemas e mal entendidos que podem surgir. No plano afectivo, a semana é promissora nos amores. Uma relação do passado surgirá na sua vida. Na saúde, influências negativas. Evite comportamentos que mais tarde podem ser fatais.”

Sorri com desdém a tanta coincidência. Decidi tirar tudo a limpo.
-Catarina? Catarina? – Gritei eu. Ela aproximou-se da porta da casa de banho.
-Não me venhas com a desculpa que precisas que te esfregue as costas.
-Não, nada disso. Olha...eu não sei como te perguntar isto...mas...
-Diz lá...
-Qual é o meu signo?
-És Sagitário.
-Bem, assim de repente. Com essa rapidez só posso assumir que tens a certeza.
-Acredita, eu sei bem qual é o teu signo. Os Sagitários são desastrados. Metem sempre o pé na argola e não sabem quando calar-se. Estão sempre à procura de novos horizontes, adoram aventuras e odeiam restrições na liberdade pessoal.
-Acho que sim....mas isso também pode ser qualquer pessoa.
-Mas porquê? Andas a ver as minhas revistas?
-Pois......que engraçado.
-Qual é a graça?
-Os nossos signos rimam. Aquário, Sagitário. Achas que é coincidência?
-Se calhar é o destino.
-Já cá faltava.
Nesse instante ouve-se a campainha da porta.
-Ó diacho.... Precisas de mais alguma coisa?
-Não.
-Então vou ver quem é... – foi a falar sozinha até à porta e eu decidi ler o meu próprio horoscópo para o tira-teimas. Percorri todos os signos à procura dele. Aqui está:

SAGITÁRIO
“Esta semana dará importantes passos na vida sentimental iniciando várias relações, uma nova e outra que é retomada. Os acontecimentos são marcados por uma lufada de ar fresco que torna a vida sentimental mais alegre. No plano económico, possibilidade de crise com redução de dividendos. Necessita de encontrar mais uma fonte de rendimentos.
Na saúde tenha especial atenção aos pés e na retenção de líquidos.”



Já não sorri. Ainda estava eu assustado com a coincidência quando começo a ouvir alguns gritos. Catarina aumenta o tom de voz para alguém. Levanto-me rapidamente, encosto a orelha à porta e tento ouvir alguma coisa. Nem precisava porque começo a ouvir vozes com maior intensidade. No início, as vozes misturam-se numa mescla imperceptível mas logo reconheço as vozes. O cabrão do bófia tinha voltado:
-Mas pensas que me enganas, ó badalhoca? – gritava o estafermo – Pensas que eu não percebo. Estive lá em baixo à espera durante meia-hora....
-Mas eu garanto que ele desceu.... pode ter saído pela porta das traseiras...
-Desde quando é que este prédio tem traseiras, porca de merda? – E de repente ouve-se um estalo. Catarina grita e eu não me contive. Borrei-me pelas pernas abaixo e os meus pés ficaram soterrados no almoço desse dia. Desconcertado por me encontrar naquela posição, tento vislumbrar uma saída enquanto a discussão na sala continua alto e a bom som:
-Vá, minha puta de merda, chama a bófia, vá. – ouvia estas palavras de forma entrecortada entre os salpicos da água. Nesse instante decidira que o melhor era lavar-me no bidé e tirar as partes maiores na banheira. Enquanto isso, Catarina continuava a ser alvo de um enxerto de porrada de um agente de autoridade – onde é que ele está, minha cabra? Ele ainda está aí, não é minha putéfia? Acabas um serviço e metes-te logo noutro, minha porca?
De repente, os gritos viram-se. No teatro violento daquela sala, ouço agora o bófia aos gritos. O enredo muda de figurino, as peças e os actores parecem agora assumir outros papéis. Catarina estava a dar luta, pensava eu. Ouvia encontrões aos móveis, jarros a partirem-se e no meio disto tudo distingui o “rosnar” de Joaquim. Vesti as calças, abri a porta devagar e tento agora ver o que se passa. Vejo a cara do bófia toda preta:
-Mas porque raio o bófia vem de barba postiça? – pensei eu. Mas logo percebo que a suposta “barba” é o incrível Joaquim agarrado com garras e dentes à cara do agente. O gato está todo maluco, encontra-se possuído por algo que eu desconheço. O bófia grita com dores lacinantes, o Joaquim não sai da cara dele, quase que a arranca com violência. Eu aproximo-me, pego numa cadeira e descarrego a energia cinética no lombo do bófia. Este cai estatelado no chão, totalmente inanimado ou morto, não sei. Catarina entretanto recompõe-se, vem ofegante, abraça-me durante uns segundos. Ficamos ali, agarrados um ao outro, num ambiente romântico até que me diz:
-Cheira a cócó.
-Hum...eh...é dele – apontei para o bófia que se encontrava deitado de barriga para cima.
-Achas que se borrou?
-Eh....É comum isto acontecer. Ouvi falar de um caso semelhante em Cinfães, no ano passado. Normalmente, as pessoas com personalidade mais violenta têm os intestinos mais cheios de gases e soltam-se com mais facilidade. Deve ter sido quando lhe dei com a cadeira nas costas, o impacto deve ter pressionado as vértebras e, vai daí, este cheiro.
-Achas que está morto?
-Pelo cheiro, sim, ah aha ahh – ri-me a bandeiras despregadas.
-A sério, Alfredo. Ele pode estar morto. Não podemos ter um polícia morto dentro de casa. E fizémos tanto barulho que alguém pode ter chamado a polícia.
-Ei, onde é que está o Joaquim? – Olhei em redor e fui encontrar novamente um pequeno vulto a movimentar-se debaixo do casaco – Joaquim? Anda cá. – O raio do gato parou. Lentamente começa a andar debaixo do meu casado e sai - Foda-se, Joaquim! Que merda é esta?
O gato vinha com o focinho branco e num ápice começou a correr de um lado para o outro. Fui buscar o meu casaco, levei a mão ao bolso e contabilizei apenas 8 sacos. A mão quando saiu veio totalmente branca.
-Alfredo? – Catarina levou as mãos à cara assustada – Diz-me que isso não é o que eu penso que é.
-Isto? Isto o quê?
-Isso é droga, não é?
-Droga? Que disparate! É um pó para o estômago, um antiácido – Entretanto o Joaquim andava em grande azafama. Corria, parava repentinamente, voltava a correr, parava novamente, miava ligeiro como se cantasse e, do nada, voltava a correr a grande velocidade – É claro que pode ser considerado uma droga, no sentido de "medicamento", mas droga no sentido de droga? Que coisa mais disparatada.
-Meu Deus, Alfredo. É mesmo droga – Catarina aproximou-se e retirara uma unha - E da boa.
-Bom, nesse caso é mesmo droga. Mas não te posso deixar cá uma grama gratuita. Já estou a ver que o caralho do gato está a estragar-me o negócio.
-Estragar? És tão mitra. Se não fosse ele, não estaria viva agora.
-Ena, para quem era superticiosa....nada mal para um gato preto que em cinco minutos já se cruzou várias vezes no teu caminho.
-Por acaso reparaste quantas vezes ele passou? Era número par ou ímpar?
-Catarina, relaxa. Agora temos de pensar numa forma de nos livrarmos deste tipo.
-E como é que achas que....
Catarina não conseguira pronunciar o resto da frase. Foram as suas últimas palavras. Decerto que ela pensara nas suas últimas e estão não estariam na shortlist. Perante a nossa distracção, o polícia recuperara minimamente os sentidos e embora deitado, e à traição, conseguira sacar da arma. Disparou dois tiros mortais. Catarina, com o impulso das balas cravadas nas suas costas, deixa-se cair. O tempo parou quando vejo o corpo daquela mulher desfalecer. Oiço de novo outro disparo e o corpo de Catarina sucumbe ao impacto. Tenho o corpo daquela mulher nos meus braços e quando olho para o bófia, percebo que ele recupera as forças para mais um disparo. Levanta o cano e vem na minha direcção. Num dos seus repentes, Joaquim passa à frente do homem e um pequeno toque no seu braço faz desviar bala que zumbe nos meus ouvidos. Quando volto a abrir os olhos, tomo consciência que o desvio de Joaquim salvou-me a vida. Lá fora, e para compor o ramalhete, oiço a aproximação das sirenes da polícia. Vários carros foram chamados ao local e nem preciso pensar muito que estou no sítio errado, à hora errada. Não conseguirei explicar nada disto, tenho cadastro e o polícia mantém-se vivo para desmentir qualquer história que possa dar como verdadeira. Por sorte, o polícia já não tem forças para levantar de novo a arma. Agarro no casaco, saco um pacotinho de pó e começo a chamar pelo bichano. Atraído pelo isco, Joaquim aproxima-se de mansinho, começa a ronronar e eu aproveito para o meter dentro do bolso: “Já me safaste muitas vezes, Joaquim”.
Quando estou a sair do apartamento oiço passos apressados subirem as escadas do prédio. Comecei a pensar nas alternativas de escape: não posso sair pelas escadas, não posso ficar em casa, não posso sair por onde entrei. Olho em frente e toco à campainha do vizinho. Ninguém abre a porta. Os passos dos polícias aumentam de intensidade, estão cada vez mais próximos. Volto a tocar com mais força, os polícias estão no patamar de baixo quando oiço uma voz de dentro de casa perguntar quem é. Eu respondo:
-É a polícia! Abra a porta.
-A polícia? Mas que raio... – o velho não terminou a frase. Já estava com o cano da minha arma entre os dentes mal abriu a porta.
-Para dentro, vá. – E a verdadeira polícia chega ao piso no preciso instante em que fecho a porta atrás de mim. Apontei a arma ao velho e fiz sinal para se manter calado.
-Caludinha - murmurei baixinho – você vive sozinho? - Ele anuiu com a cabeça – Pouco barulho senão temos o caldo entornado.
Fiquei com a cabeça encostada à porta para ver se percebia alguma coisa do que se passava. Contei uma meia dúzia de agentes. Mas mal descobrissem o cadáver de Catarina, seria um ninho de polícias e agentes da Judiciária. Ouvi um dos bófias dar instruções a um outro. Ouvi claramente a palavra “vizinhos”. Iriam concerteza falar com todos os inquilinos, incluindo este.
-Oiça, avô. Há duas formas de fazer isto. A bem ou a mal. Como é que vai ser? – O velho fitou-me nervoso. Nesse instante, batem com estrondo à porta.
-Polícia! Está alguém em casa? Abra a porta! - batem violentamente na porta, não será chuva nem será gente - Polícia! - voltaram a gritar do lado de fora - Abra a porta!